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Thursday, September 13, 2007
O Coração e o CEP
O coração e o CEP
ALOYZIO ACHUTTI/ Médico
(Artigo publicado na ZH de hoje sobre o trabalho premiado no 62o. Congresso da SBC)
Passeando pelos 73 bairros de nossa "Mui Leal e Valerosa" cidade, dá para ver facilmente a desigualdade das condições de vida de nossos conterrâneos, mas muita gente não sabe que na medida em que os moradores se afastam das condições mais adequadas de vida humana, tanto maior o risco de morrer precocemente também do coração. Poder-se-ia dizer que o Código de Endereçamento Postal (CEP), designando o bairro, permite predizer o risco das pessoas que lá moram como sendo até três ou mais vezes superior de morrer de infarto ou acidente vascular cerebral, quando comparados com outros moradores de bairros privilegiados.
Um trabalho com esses dados, entre 960 outros apresentados em São Paulo, durante o 62º Congresso da Sociedade Brasileira de Cardiologia, recebeu o prêmio como o melhor tema da área de epidemiologia e clínica.
A prefeitura tem trabalhado buscando, através de técnicas de geoprocessamento, caracterizar sob vários aspectos nossa população. Pela primeira vez, entretanto, com todo o rigorismo científico, em co-autoria com dois professores da UFRGS - doutor Sérgio Luiz Bassanesi e doutora Maria Inês Reinert Azambuja - , demonstramos o quanto a desigualdade social compromete a saúde, manifestando-se também através de doenças cardiovasculares. É preciso, de uma vez por todas, corrigir a falsa idéia de que as cardiopatias sejam "privilégio" dos mais afortunados.
Sete variáveis foram utilizadas para caracterizar níveis de desenvolvimento humano (educação, renda, violência, mortalidade infantil, envelhecimento, fecundidade e habitação), criando-se quatro categorias nas quais cada bairro, por semelhança, foi sendo agregado. Ordenando também os óbitos registrados dos 45 aos 64 anos por doenças circulatórias, entre 2000 e 2004, e sua freqüência proporcional à respectiva população por bairro, desenha-se um mapa com categorias superponíveis àquelas quatro das desigualdades sociais.
O risco relativo médio de morrer mais cedo aumenta consistentemente quando se passa de um estrato para outro (1,0-1,62-2,17 e 2,63), provando uma vez mais que pobre desenvolvimento humano faz mal para a saúde e que, além de prover por melhor assistência aos já comprometidos, é preciso investir preferencialmente em educação, moradia, renda e tudo o mais que possa reduzir a desigualdade social em nosso meio.
Demonstramos também em outro estudo apresentado no mesmo congresso que, com a assistência somente para aqueles cardiopatas mais graves, com indicação de tratamento hospitalar em 2004 em todo o Brasil, gastaram-se perto de R$ 10 bilhões, e quase duas vezes mais alcançou a estimativa dos custos indiretos por mortalidade precoce e perda de produtividade.
A solução não está em mudar de bairro, mas de entender o que ficou mais uma vez demonstrado: que inversões em saúde e qualidade de vida não deveriam ser consideradas como despesa, mas como investimento que vai refletir na produtividade, na expressão da capacidade criativa, no desenvolvimento e na paz social.
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