Friday, June 27, 2008

INCERTEZA E PROBABILIDADE...

27 de junho de 2008 N° 15645
Artigo ZERO HORA
Incerteza e probabilidade..., por Aloyzio Achutti *

Notícias sobre morte súbita de notáveis, como as recentes de um famoso jornalista americano (Tim Russert) e de nossa ex-primeira-dama (Ruth Cardoso), mexem com todo mundo, são motivo de insegurança e muito questionamento sobre médicos e medicina.Gostaríamos que nossos ídolos não fossem tão vulneráveis, que médicos fossem onipotentes e que a medicina não fosse tão limitada. Se pessoas tão famosas estão sujeitas a tais vicissitudes, mais ainda o comum dos mortais...

Uma frase famosa do pai da clínica médica moderna (William Osler), no início do século passado, dizia que "medicina é a ciência da incerteza e a arte da probabilidade". As conquistas da ciência, ajudadas pela nossa empáfia, alimentam a fantasia de certeza e infalibilidade. Sabemos hoje das limitações do conhecimento da própria mecânica celeste e das matemáticas. A medicina, baseada na ciência biológica, ainda mais sujeita a variações e incertezas, contrabalança o que lhe falta de ciência com a arte da probabilidade, adquirida na observação do comportamento das coisas naturais. É por isso que, mesmo contando com todo o avanço tecnológico, não se consegue entregar nem o diagnóstico, nem a escolha do tratamento, para uma máquina decidir sozinha.

É possível diminuir a surpresa se lembrarmos que em torno de 40% das mortes de causa cardíaca se enquadram nos critérios de subitaneidade (desenlace ocorrendo dentro das primeiras 24 horas do início dos sintomas); que grande parte dos óbitos também não vem de pessoas gravemente doentes, mas de gente com aparência saudável; e que a maior eficácia da medicina radica na prevenção, e não em intervenções em fases avançadas da doença.
Não nos deveria causar surpresa - embora nos deixe ainda com mais incertezas - a única verdade imutável: a de que todos nós, como indivíduos, um dia haveremos de morrer, para garantir a biodiversidade e a continuidade da espécie.

Um neurobiólogo americano (Robert Sapolsky), estudando estresse provocado pela incerteza, trabalhou com o total desconhecimento do futuro e com o conhecimento prévio do que vai nos acontecer. E chegou à conclusão de que o melhor é ainda viver do modo habitual, com meia verdade, aproveitando o momento atual, tomando as decisões mais adequadas dentro do conjunto do conhecido, deixando de lado o espectro do desconhecido e do futuro.

Quando se inverte uma equação estatística, por exemplo, dizendo que 2% morreram ou que 98% sobrevivem - o que dá no mesmo - , nossa reação é diferente. Costumamos nos assustar mais com a incerteza e com a morte do que valorizar as chances (probabilidades) e as conquistas da vida.
*Médico

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