Sunday, March 25, 2012

INDIVIDUO, CONSUMIDOR, CIDADÃO E MARGINAL


(Artigo enviado para ZH há uma semana e não publicado)
INDIVIDUO, CONSUMIDOR, CIDADÃO E  MARGINAL.

Aloyzio Achutti. Médico.
Para todos os efeitos é essencial a distinção entre indivíduos isolados ou inseridos em seu contexto.  A humanidade caminhou neste sentido: de predominantemente rural, passou a urbana (na ocupação do espaço físico), e agora vem quebrando as últimas barreiras de isolamento através da comunicação global. Não nos preocupemos em comparar o rural com o urbano, pois mesmo no ambiente rural os indivíduos não estão isolados, mas apenas se organizam em comunidades menores. Entretanto nas cidades fica mais evidente a estruturação social, a interdependência, os interesses, os conflitos, a segregação, e a multiplicidade das relações que se perdem quando se ignoram as circunstâncias.
Estatísticas, onde indivíduos são reduzidos a coleções de números, facilmente são desvalorizadas as relações entre os elementos individuais – mesmo usando técnicas epidemiológicas (populacionais) para evitar fatores de confusão. À beira do leito, no hospital ou no consultório, examinando um paciente isolado de sua família, fora de seu ambiente de trabalho e de vida, e às vezes desgarrado de sua própria história, é muito difícil compreender como começa a doença, e o que realmente é possível fazer para prevenir ou tratá-la.
Faz parte do desenvolvimento da personalidade a descoberta da própria identidade como indivíduo, mas é necessário evoluir para uma consciência progressivamente coletiva, reconhecendo os demais membros da família, os conterrâneos, e depois toda a humanidade.
É possível que arquétipos relacionados com defesa do território estejam no comando da segregação, mas hoje se sabe que as trocas, o intercâmbio e a miscigenação trazem vantagens. A própria biologia, garantindo a evolução, se baseia no intercâmbio gênico, na reprodução, e mesmo no convívio, até entre espécies distintas. O próprio mercado demonstra cabalmente o significado do comércio para o desenvolvimento sociocultural, embora haja problemas ao se estruturar a sociedade conforme seu poder de compra, confundindo o cidadão como mero consumidor.
Ninguém fica satisfeito com a desigualdade social, mas a segregação dos menos validos é uma burra saída para tentar afastá-los da vista. Quanto mais aversão, tanto maior a atração para  comer nossas migalhas ou desfrutar nossas benesses.
Não se pode desprezar o esforço de assistir os marginalizados, mas quem sabe a estratégia deveria ser invertida: trabalhar os privilegiados (detentores do poder e da ciência), responsáveis pelo status quo, para reincorporar progressivamente os demais. Na condição de marginalizados não dispõe de conhecimento, poder político, nem recursos para buscar alternativa. Para participar, só conhecem a violência.
Se todos pudéssemos ser cidadãos equivalentes, poderíamos aumentar a capacidade de produção, a potencialidade de consumo e nosso mútuo bem estar.

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