ZH: 09 de agosto de 2009 | N° 16057
por Luís Beck da Silva Neto*
A epidemia de influenza H1N1 está longe de ser uma epidemia de “gripe como as outras” como veiculado por autoridades da Saúde.
Embora formado há 15 anos e trabalhando em UTI, ainda não havia visto uma UTI com 11 pessoas com o mesmo diagnóstico. Temos gripes todos os invernos, mas em nenhum ano as gripes tiveram esta repercussão. Em hospitais do interior do Estado, sabe-se que a situação não é diferente.
As orientações do Ministério da Saúde têm sido no mínimo contraditórias. Recomendaram, até dias atrás, tratar apenas os casos graves com o Oseltamivir (antiviral anti-Influenza – Tamiflu), enquanto a recomendação é usar a droga nas primeiras 48 horas da doença. Assim, torna-se uma loteria a determinação de quem receberá o remédio, e os que o recebem o fazem tardiamente. No Rio Grande do Sul, dentre os óbitos registrados pela doença, não consta que esses pacientes tiveram a oportunidade de receber Tamiflu.
A profilaxia dos contatos, no Brasil, não tem sido realizada. Nossos colegas médicos, e outros profissionais de saúde, estão na linha de frente, atendendo em emergências e UTIs, utilizando as medidas de proteção disponível (máscaras), mas sem profilaxia medicamentosa. O Center for Disease Control (CDC) dos Estados Unidos recomenda a profilaxia com Oseltamivir para os profissionais de saúde que examinam pacientes infectados ou com suspeita de infecção, sem a proteção adequada. Um profissional que permanece por 12 horas atendendo em uma sala de emergência contaminada tem alta chance de contágio e deveria incluir-se no critério recomendado pelo CDC.
No Brasil, o governo recolheu o medicamento das farmácias, possui milhões de cartelas do remédio em sua posse e não tem a destreza necessária para distribuí-lo aos doentes. Os remédios estão disponíveis nos hospitais, mas a recomendação do ministério é de que os pacientes não procurem os hospitais, que busquem informações nos postos de saúde. Está correto descentralizar a assistência, pois a aglomeração não é recomendada. Mas como a população vai ser tratada se o remédio está centralizado! Este é um paradoxo que merece ser explicado.
O argumento de recolhê-lo para evitar a resistência do vírus ao Oseltamivir é pífio, se não irônico. É possível comprar qualquer antibiótico livremente nas farmácias, inclusive antibióticos de amplo espectro sem qualquer exigência de receita médica. Por que agora tamanho rigor “científico” em meio a uma epidemia de proporções ainda desconhecidas? Bastaria implantar um efetivo sistema de controle de venda através da prescrição médica. Além disso, não há setor do Ministério da Saúde que funcione à noite. Isto obriga a população a ser tratada apenas em horário comercial.
O ministro da Saúde, senhor José Gomes Temporão, reafirma que este vírus “tem uma taxa de letalidade semelhante ao vírus da gripe comum”. Ora, a letalidade é simplesmente desconhecida, num contexto de franco subdiagnóstico (por falta de laboratórios capacitados), de subnotificação e subtratamento, devido à definição de tratar apenas os pacientes em estado grave.
Portanto:
1. A população está pouco informada da gravidade e, por conseguinte, pouco vigilante;
2. Os serviços públicos de saúde, normalmente já saturados, nesta situação tornam-se críticos e, certamente, insuficientes;
3. O remédio está indisponível, por determinação “superior”;
4. As características da doença são desconhecidas e indicam possibilidades de quadros graves e fatais, inclusive em pessoas jovens e saudáveis;
5. Os médicos estão expostos e sem a prevenção farmacológica recomendada internacionalmente;
Na minha opinião:
1. A prevenção é a maior arma. E para isso as pessoas devem estar informadas e seguir medidas de prevenção;
2. Deve-se evitar lugares com muitas pessoas;
3. Usar máscara liberalmente;
4. Lavar as mãos frequentemente;
5. Usar álcool gel liberalmente;
6. Se estiver febril ou com sinais de gripe, não sair de casa. Aguardar determinações para o uso de Oseltamivir (Tamiflu), que, creio, deverá ter seu uso afrouxado em breve. Espera-se.
*Internista e cardiologista, doutor em Medicina pela UFRGS, professor do Programa de Pós-Graduação em Cardiologia da UFRGS
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