De: Maria Inês Reinert Azambuja [mailto:miazambuja@terra.com.br]
Enviada em: segunda-feira, 21 de maio de 2007 00:03
Assunto:
Re: [2350 - AMICOR10 - 20/05/2007]
Tendências na Mortalidade regional por DCV no BR
Caros AMICOR,
Esta é uma provocação que eu não poderia deixar passar mesmo!
O documento do Ministério da Saúde http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/saude_brasil_2005.pdf tem um capítulo sobre tendencias na mortalidade por doenças não transmissíveis (capítulo 10), que mostra exatamente o que diz o Dr. Romildo Andrade: queda significativa na mortalidade (figuras anexas), especialmente nas regiões sudeste e sul, que tradicionalmente tinham os índices mais elevados e mais bem documentados. E tendencias inconsistentes nas regiões norte e nordeste, que tradicionalmente tinham muito subregistro como diz a Ines, e não sei como estão hoje.
Outro dado que pode ser surpreendente é que no Brasil o AVC tem taxa de mortalidade semelhante a da doença isquemica do coração, um dado muito diferente do dado norte-americano, e acho que também pouco divulgado por aqui.
A primeira questão então é, por que não se sabe disto no Brasil? Por que a surpresa de quase todo mundo quando se diz que a mortalidade por doenças cardiovasculares está caindo há muitos anos no país, como está caindo, aliás, em todo o mundo?
Possivelmente porque não é isto o que dizem as agencias internacionais e todos os artigos internacionais voltados a projetar a morbimortalidade no terceiro mundo nos próximos anos. A mensagem veiculada por todos é a de uma esperada “migração” da epidemia de doenças cardiovasculares - que teve seu ápice na década de 60 nos EUA e um pouco depois na Europa - para o “sul”, a medida que nossos países assumam os estilos de vida do norte e nossas populações envelheçam.
O interessante é que a evidência empírica de declínio na mortalidade também aqui não tem o poder de mudar o diagnóstico das agências internacionais, e nem sua prescrição: mudar os sistemas de saúde dos nossos países para privilegiar o tratamento das doenças cronicas, e identificar e tratar precocemente os indivíduos sob risco para reduzir/controlar a esperada epidemia. Já publiquei um comentário sobre isto no PROCOR em 2004, mas nunca consegui publicar coisa semelhante em nenhuma revista internacional.
Agora tentando responder à questão levantada. Por que está caindo? A minha explicação exige que reconsideremos tudo o que aprendemos sobre doença isquemica do coração. Desde 1994 tenho tentado discutir uma hipótese que associa a epidemia de DIC do século XX à Pandemia de Influenza de 1918. Tanto a hipercolesterolemia como à trombose e morte súbita associadas à DIC nas décadas de 50 e 60 seriam respostas imunopatológicas associadas à infecções recorrentes por influenza em sobreviventes vulneráveis marcados pela Pandemia de 1918 (aqueles que tinham 20-40 anos em 1918 e responderam por 2/3 dos óbitos durante a Pandemia). - A idéia é muito semelhante à da progressão da cardiopatia reumática associada à re-infecções por estreptococo. A redução dos óbitos teria acompanhado a eliminação daquelas coortes marcadas da população. Os casos de DIC hoje, como os que ocorriam antes de 1920, representam outra doença, associada à resistência à insulina, com manifestações clínicas e anátomo-patológicas diferentes daquelas que predominavam em 1960 (especialmente a hipercolesterolemia e a mote súbita).
As implicacões desta hipótese são muito grandes para os nossos países. Se a hipótese é correta, não haverá migração da epidemia de DCV para o terceiro mundo como predito pelas agencias internacionais. Parece-me que os dados brasileiros tendem a corroborá-la.
Acabo de publicar um artigo extenso sobre isto, com a colaboração do professor Richard Levins, de Harvard, na Perspectives in Biology and Medicine. Tenho tido alguns retornos bem interessantes. Vamos ver o que acontece. Posso enviar cópia do artigo aos interessados.
Um abraço,
Maria Inês Azambuja
UFRGS-Porto Alegre
Caros AMICOR,
Esta é uma provocação que eu não poderia deixar passar mesmo!
O documento do Ministério da Saúde http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/saude_brasil_2005.pdf tem um capítulo sobre tendencias na mortalidade por doenças não transmissíveis (capítulo 10), que mostra exatamente o que diz o Dr. Romildo Andrade: queda significativa na mortalidade (figuras anexas), especialmente nas regiões sudeste e sul, que tradicionalmente tinham os índices mais elevados e mais bem documentados. E tendencias inconsistentes nas regiões norte e nordeste, que tradicionalmente tinham muito subregistro como diz a Ines, e não sei como estão hoje.
Outro dado que pode ser surpreendente é que no Brasil o AVC tem taxa de mortalidade semelhante a da doença isquemica do coração, um dado muito diferente do dado norte-americano, e acho que também pouco divulgado por aqui.
A primeira questão então é, por que não se sabe disto no Brasil? Por que a surpresa de quase todo mundo quando se diz que a mortalidade por doenças cardiovasculares está caindo há muitos anos no país, como está caindo, aliás, em todo o mundo?
Possivelmente porque não é isto o que dizem as agencias internacionais e todos os artigos internacionais voltados a projetar a morbimortalidade no terceiro mundo nos próximos anos. A mensagem veiculada por todos é a de uma esperada “migração” da epidemia de doenças cardiovasculares - que teve seu ápice na década de 60 nos EUA e um pouco depois na Europa - para o “sul”, a medida que nossos países assumam os estilos de vida do norte e nossas populações envelheçam.
O interessante é que a evidência empírica de declínio na mortalidade também aqui não tem o poder de mudar o diagnóstico das agências internacionais, e nem sua prescrição: mudar os sistemas de saúde dos nossos países para privilegiar o tratamento das doenças cronicas, e identificar e tratar precocemente os indivíduos sob risco para reduzir/controlar a esperada epidemia. Já publiquei um comentário sobre isto no PROCOR em 2004, mas nunca consegui publicar coisa semelhante em nenhuma revista internacional.
Agora tentando responder à questão levantada. Por que está caindo? A minha explicação exige que reconsideremos tudo o que aprendemos sobre doença isquemica do coração. Desde 1994 tenho tentado discutir uma hipótese que associa a epidemia de DIC do século XX à Pandemia de Influenza de 1918. Tanto a hipercolesterolemia como à trombose e morte súbita associadas à DIC nas décadas de 50 e 60 seriam respostas imunopatológicas associadas à infecções recorrentes por influenza em sobreviventes vulneráveis marcados pela Pandemia de 1918 (aqueles que tinham 20-40 anos em 1918 e responderam por 2/3 dos óbitos durante a Pandemia). - A idéia é muito semelhante à da progressão da cardiopatia reumática associada à re-infecções por estreptococo. A redução dos óbitos teria acompanhado a eliminação daquelas coortes marcadas da população. Os casos de DIC hoje, como os que ocorriam antes de 1920, representam outra doença, associada à resistência à insulina, com manifestações clínicas e anátomo-patológicas diferentes daquelas que predominavam em 1960 (especialmente a hipercolesterolemia e a mote súbita).
As implicacões desta hipótese são muito grandes para os nossos países. Se a hipótese é correta, não haverá migração da epidemia de DCV para o terceiro mundo como predito pelas agencias internacionais. Parece-me que os dados brasileiros tendem a corroborá-la.
Acabo de publicar um artigo extenso sobre isto, com a colaboração do professor Richard Levins, de Harvard, na Perspectives in Biology and Medicine. Tenho tido alguns retornos bem interessantes. Vamos ver o que acontece. Posso enviar cópia do artigo aos interessados.
Um abraço,
Maria Inês Azambuja
UFRGS-Porto Alegre
No comments:
Post a Comment