IA, ritos e alegria.
Boa
tarde a todos, primeiramente uma confissão, ou melhor, duas: - antes de eu vir
para cá minha mulher disse que eu estava proibido de chorar, pois a formatura
não era minha. Vou tentar.
Outra:
nunca assisti ou participei de uma formatura, nem da minha, lá nos idos tempos
das Ciências Sociais. Dito isto, desde já quero agradecer aos meus queridos
alunos, que se formam nesta tarde, por esta oportunidade. Muito em breve
estarei no tempo para me aposentar – mas não vou me aposentar. Bom, eu nunca
tinha sido convidado para ser paraninfo, fico muito honrado e de todo o coração
eu declaro. Quero então, assim, no começo parabenizá-los todos e seus
familiares, assim como também cumprimentar os demais formandos, cumprimentos ao
magnífico Reitor em exercício Ruy Vicente Oppermann, pró-reitores, meus colegas
e demais pessoas presentes neste ritual acadêmico na nossa prestigiada
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Eu
também preciso referir algumas coisas, contar uma que outra história, mas prometo
ser muito breve. Vejam como são as coisas, em 1948 minha Tia Lia Achutti, filha
de um fotógrafo e farmacêutico, entrou aqui na UFRGS, justo no IA, então num
dia como este de hoje, no ano de 1951, aqui no meu lugar, falando ou lendo,
estava o artista e professor, de saudosa memória, prof. Ângelo Guido formando a
minha tia Lia, que um tempo depois ajudou a fundar o Instituto de Artes da
Universidade Federal de Santa Maria, além de durante muito tempo também ensinar
arte às crianças de lá. Ela está muito bem, tem hoje 87 anos, ainda expõe e
participa de eventos no campo das artes visuais. Percebam então meus queridos
alunos, o enorme tempo que vocês terão pela frente empunhando a bandeira das
artes, trabalhando com arte, pesquisando sobre arte e/ou produzindo belos
trabalhos.
Aqui
vou confessar uma das histórias de sala de aula na cadeira, disciplina que mais
gosto, na qual ensino e praticamos receitas das técnicas fotográficas da fase
inicial, pré-industrial, da Fotografia.
Sempre digo para os alunos, que eles é que são felizes, porque no mesmo
andar da nossa sala, aqui nesse campus, havia as famosas disciplinas de Cálculo
II das exatas, uns alunos lutando no cálculo I, II e os meus fazendo
fotografias com pincéis, usando preparados químicos que seriam levados a luz solar.
Isso para dizer que se dos cálculos
um e dois depende o mundo, das artes a felicidade depende. Eu também dizia, pessoal aqui vocês estão numa
bolha de bem estar e fruição prazerosa, enquanto lá fora o mundo quase em
guerra. Tudo metafórico claro e espero que assim permaneçamos todos, em busca
de crescimento, paz e felicidade.
Acredito
profundamente que a Arte é uma forma de ver e viver o mundo, onde quer que
seja. E vocês meus alunos saem
preparados certamente com lentes outras para ver o mundo e sei que serão
felizes e alegres como sempre os vi serem nas aulas durante este tempo de curso.
A
foto que dei de presente para vocês não foi escolhida ao acaso, fotografei-a em
1989 quando fui ao Macapá, capital do Amapá visitar uma região quilombola
chamada Curiau. Ainda no carro vi de relance uma casa estranha, muito simples
com a fachada mais enfeitada que o todo, desci, fiz a foto e depois me dei
conta de que mais parecia um plano cenográfico ou uma grande tela esticada
contra o céu.
Assim
eu vejo a Arte, como o domínio, o poder de transformar os elementos que
constituem a vida para reinseri-los nela. Vejo também como a atividade que leva
as pessoas a sonharem de olhos abertos. Os franceses têm dois verbos ‘sonhar’, rêver
e songer,
este último certamente afeito ao campo das artes, arrisco-me dizer.
Um
dia, já tarde da noite, escutei numa rádio parisiense um senhor de bastante
idade dando uma entrevista em homenagem a um amigo que acabara de morrer, ele
disse uma frase que nunca mais vou esquecer:
“meu
amigo fulano foi um verdadeiro artista por que ele soube, como mais ninguém,
Encantar a matéria comum, cotidiana – ordinaire em francês mas traduzida
literalmente ficaria muito forte em português.
Vocês
meus alunos saem daqui para isso, com esta condição, dar encantamento a um
mundo que se pode dizer, no geral, um tanto sem contraste, um tanto apagado,
comum demais.
Sejam
felizes e tenham toda a sorte do mundo, beijos, Muito obrigado.
Achutti,
17 de janeiro de 2015.
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