ARTIGOS
Responsabilidade social, por Aloyzio Achutti*
Além dos cuidados pessoais, estamos atentos para nossos familiares, cuidamos de nossa casa, de nosso jardim, temos preocupação com o meio ambiente, evitamos a poluição e o desperdício. Esse comportamento, já incorporado a nossa cultura, não exige mais esforço para muita gente; pelo contrário, sentimos mal-estar e insegurança quando observamos um comportamento desviante.
Convivemos, entretanto, com enorme desigualdade socioeconômica que nos parece natural. Não mais nos comove, nem nos move, a não ser para desviarmos dela nosso olhar.
Será por ignorância? Por sensação de impotência? Ou por acharmos que não é conosco?
Estava lendo o Manifesto Antropofágico, de Oswald de Andrade, lançado há 80 anos: “Só não há determinismo – onde há mistério. Mas o que temos nós com isso?”.
Fui rever os dados de nossa recente pesquisa sobre onde o risco de morrer precocemente por doenças cardiovasculares pode ser três vezes maior, dependendo do bairro onde se vive. No grupo privilegiado, dos 45 aos 64 anos (com maior chance de promover mudanças), éramos um quarto da população, enquanto correspondiam a 21,6% os situados no outro extremo, onde faltam educação, emprego, renda, condições de moradia, perspectiva e qualidade de vida, e saúde.
Por que não começar organizadamente por esses, “adotando um por um”, ajudando-os – não paternalisticamente – a se livrar da teia na qual estão presos? Adotam-se árvores, animais, praças e jardins. Por que não adotar pessoas ou bairros nos quais elas moram? Alguém dirá: isto é tarefa de governo. Então façamos com que o governo o faça!...
A tarefa não é impossível, e já existem exemplos práticos com resultados. Tomemos o caso do Hospital Moinhos de Vento, que poderia ficar olhando somente para dentro de seus muros, restringindo-se aos objetivos imediatos de uma empresa hospitalar. Obviamente existem interesses ligados aos incentivos do governo para filantropia, mas os resultados vão muito além: pessoas são assistidas em suas necessidades de saúde, treinam-se profissionais para olhar para fora da janela do consultório e do hospital, nos dão o exemplo e a oportunidade de nos engajarmos e ampliar sua atuação. São projetos localizados no Morro da Cruz, na Ilha Grande dos Marinheiros, na Ilha da Pintada e na Vila Restinga, além de atendimento a entidades educacionais e o Núcleo Mama.
Individualmente ou juntando-nos a projetos sociais de empresas ou outras entidades, ou mesmo em parceria com o governo, poderíamos assumir nossa responsabilidade social, fazendo acontecer agora. Além de satisfazer uma necessidade básica de solidariedade, estaríamos investindo em nossos recursos humanos, aumentando nossa força de trabalho e a produtividade, permitindo expansão do consumo, desenvolvendo nossa cultura e aliviando sofrimento e custos com saúde. Poderemos até sonhar em retirar as grades que cercam nossas casas e viver numa cidade mais segura e mais humana.
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