O Dia Mundial da Diversidade Cultural para o Diálogo e o Desenvolvimento foi criado pela UNESCO e, desde 2001, é celebrado no dia 21 de maio. Nas palavras de Koichiro, Matsuura, Diretor-Geral da UNESCO na época do surgimento da data: “A recorrência deste evento nos fornece a oportunidade de medirmos a nossa capacidade de promover, com base no que é hoje uma fundação estabelecedora de padrões coerentes, uma visão integrada da cultura nas complexas áreas de desenvolvimento, inovação, diálogo e coesão social”. Em outras palavras, a data foi idealizada para que houvesse uma maior integração e troca de culturas, ideias e propostas entre todos os países, promovendo um maior diálogo e descoberta de ações coletivas.
Quando pensamos no panorama atual, na pandemia de Covid-19 pela qual passamos, fica ainda mais nítido que ações de diálogo e atitudes colaborativas no cenário global são de grande importância, não apenas para o avanço da sociedade como um todo, mas também para sua manutenção, preservando a saúde e bem-estar de todos nós. Porém, como este cenário tem se desenrolado? Existem atitudes colaborativas que podem ser realmente eficazes em situações como esta em que vivemos? Quais os entraves político-culturais devem ser considerados no momento de pensar soluções? Na tentativa de responder essas e algumas outras questões, desenvolvemos este artigo em colaboração com o Dr. Aloyzio Achutti, cardiologista no Hospital Moinhos de Vento.
Somos seres interligados e interdependentes
Antes da análise de qualquer panorama, é importante compreendermos que no universo estamos todos interligados, mesmo que não consigamos, ou não queiramos, aceitar a realidade. Somos interdependentes mergulhados numa sopa ecológica na qual tudo necessariamente se relaciona e se interconecta, mantendo um equilíbrio necessário. Nós somos formados de um conjunto de órgãos que têm que funcionar harmonicamente (não dá certo, por exemplo, se o fígado resolve brigar com o coração). Cada órgão é formado de células que contém organelas e moléculas que precisam funcionar harmonicamente para haver vida.
Estima-se maior do que dez trilhões o número de células de nosso corpo e dez vezes maior o número de bactérias, com as quais convivemos e das quais dependemos no intestino de cada um de nós. Com vírus estamos em permanente interação e em número ainda maior do que o das bactérias.
Até aqui nos detivemos em nosso próprio corpo, mas cada um de nós é dependente das outras pessoas com as quais convivemos, e todas as outras existentes na terra, mesmo que não tenhamos consciência dessa ligação. Estamos inter-relacionados com todos os outros seres vivos existentes através dos quais nos alimentamos e nos informamos. Somos produtos de nossos ancestrais – ninguém nasceu do nada, e a história da evolução da vida na Terra se perde no passado.
Mencionamos somente seres vivos, mas todo o universo está também interdependente e interagindo, mesmo que não tenhamos condições de apreciar as dimensões ecológicas universais. A sobrevivência e o sucesso na evolução das espécies depende de capacidade de adaptação e do desenvolvimento conseguido através da interação no conjunto.
Diversidade enquanto incentivo ao desenvolvimento social
A cultura surge enquanto forma de expressão daquilo que há de mais idôneo no comportamento humano, linguagem, música, religião são fatores que ditam as formas de atuação em grupo, independente do lugar do mundo. Grupos diversos proporcionam uma enorme heterogeneidade cultural e, assim, principalmente da modernidade até então, apareceu como um dos principais elementos de incentivo ao desenvolvimento enquanto sociedade.
As diferenças trazem esperanças da existência de grupos mais sensíveis, capazes de compreender os valores positivos e encontrar caminhos para o desenvolvimento não somente material e intelectual-cognitivo, mas também emocional. Estes fatores são fundamentais para que, enquanto sociedade, possamos superar crises como a que vivemos atualmente. A diversidade influi sempre nas relações entre as nações, pois os modelos da sociedade atual são produtos de experiências anteriores e não é possível modificar comportamentos de forma abrupta, esta questão pode propiciar alguns entraves, principalmente em questões políticas, da mesma forma que é um grande mar de possibilidades.
Ações colaborativas na luta contra o vírus: possíveis entraves político-culturais
Quando tratamos de ações colaborativas, falamos de comportamento com motivações agregadoras, e com um objetivo comum. Tais atitudes se referem a nações numa perspectiva de sociedade e, consequentemente, também política e coletiva.
O atual momento têm proporcionado o surgimento de narrativas, incriminando em geral, grandes potências econômicas e políticas mundiais enquanto responsáveis pelo início e disseminação da crise atual. Com isso, vemos o surgimento e disseminação de hipóteses compatíveis com síndrome conspiratória, e se exacerbam idiossincrasias e partidarismos doentios. Mas, o que espera-se é que, frente a um real e inequívoco risco, esqueçam-se rixas e interesses secundários que possam atrapalhar o instinto gregário e de defesa da espécie.
Afinal, em uma situação onde milhões de pessoas são afetadas, a principal ação que as nações devem tomar é a de superar quaisquer diferenças, independente de sua natureza. A data de hoje surgiu exatamente para que possamos usar nossa diversidade enquanto uma ferramenta capaz de oferecer soluções plurais para solucionar os mais diferentes problemas globais.
Fator econômico: elemento crucial nos contextos ocasionados pela pandemia
A pandemia atinge todas as camadas da sociedade, porém algumas mais do que outras. Como em muitas outras situações, os setores mais afetados são os mais pobres, com menor acesso à educação e com menos recursos para se defender. O objetivo do Dia Mundial da Diversidade Cultural para o Diálogo e o Desenvolvimento, principalmente neste ano, é pensar em soluções que cheguem até essas pessoas mais vulneráveis, pensando em ações colaborativas a fim de diminuir o contágio e acometimentos, tanto por meio de práticas econômicas, quanto de saúde, buscando, através de pesquisa integrada, soluções como remédios e vacinas.
Em momentos de crise, quando as barreiras de privilégio se quebram é quando temos a oportunidade para reformular a maneira de ver a vida e a história. São momentos oportunos para reflexão e reformulação de conceitos, consciência e condutas para agir de forma mais inteligente e nos defendermos como um todo, cuidando em especial dos mais carentes, em maior risco ou incapazes de compreender e colaborar.
A relação da população com a comunidade médica e científica em tempos de pandemia
Conforme os dias e semanas de pandemia vão avançando, podemos notar reações diversas da população: alguns têm entrado em pânico, outros resistem em acreditar ou negam, há gente que prefere se arriscar e arriscar os outros. Há pessoas que tentam tirar proveito da crise e da necessidade de adotar medidas restritivas.
Há um inequívoco aumento do respeito e reconhecimento do papel dos profissionais da saúde, mas, embora estejamos longe de conseguir que os médicos e médicas, enfermeiros e enfermeiras, junto da população, tenham uma visão completa da interdependência entre nós e o meio ambiente, é preciso falar e discutir o assunto para que, progressivamente, se incorpore às nossas culturas, para que as novas gerações já se preparem e se formem numa visão mais adequada.
Certamente, momentos como este de crise, de sofrimento, de perdas e de choque cultural, podem servir como ponto de reajuste da perspectiva para contemplar a diversidade e dar chance ao desenvolvimento integral, desejável em todas as esferas: material, orgânico, biopsicossocial-ecológico.
A diversidade cultural, junto de ações colaborativas enquanto saída para superarmos a pandemia
Uma das coisas mais importantes a se pensar neste panorama é que, temos, enquanto sociedade, um grande potencial para superarmos esta pandemia. O Dia Mundial da Diversidade Cultural para o Diálogo e o Desenvolvimento vem para que nós lembremos do poder da diversidade na descoberta de soluções para quaisquer problemas, pois, apenas juntos, progrediremos enquanto grupo, enquanto humanos.
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